Outro dia numa lista de discussão, um participante lançou uma pergunta sobre qual seria o melhor ERP para uma empresa de médio porte.
Fiquei com pena dele. Na ânsia de ajudar, muita gente (inclusive eu) respondeu um monte de coisa, mas a pergunta mesmo dele, ficou sem resposta…
Mas, o fato é que: bem, não há uma resposta única. Este é o ponto.
Aliás, antes mesmo de uma empresa se perguntar “qual o melhor ERP”, a pergunta deve ser “por que pensamos em um ERP”? E depois dessa: “será que é de um ERP que precisamos?”.
E, mesmo se passar por essas perguntas, muitas outras se seguirão.
Para complicar ainda mais, muito em função dos diversos casos de implantações de ERP mal sucedidas, domina o mercado aquela aura pesada sobre os sistemas integrados. O que é uma pena, pois existem muito boas opções de sistemas.
O que acontece na maioria dos casos é um conjunto de equívocos que começam na escolha (ou seja, na pergunta àquelas questões iniciais), e continuam no planejamento do projeto, na falta de envolvimento da empresa na decisão e por aí vai… no final das contas, o pobre coitado do software, esse ser enigmático, que a gente xinga, vira o bode expiatório.
O que fazer então?
Um caminho que gostaria de propor, neste e em próximos posts, parte do entendimento que a adoção de um ERP (ou de qualquer sistema) deve ser tratada a de um entendimento do Ciclo de Vida do ERP, representado na figura a seguir.

Este ciclo é uma sugestão minha, mas, certamente, há outras visões a respeito, com outras fases desse ciclo de vida, outras maneiras de representar.
Pode parecer estranha esta visão como um ciclo de vida, pois dá a impressão de que o processo de implantação de um ERP é uma empreitada sem fim. Mas, de certa forma, é mesmo.
Todo software evolui continuamente. Basta ver a quantidade de novas versões dos diversos softwares comerciais que são lançados todos os anos.
Diversos fatores, que vão desde a evolução natural da tecnologia, até mesmo as alterações de necessidades de negócio, ocasionam uma contínua evolução dos softwares. No caso do Brasil, o cenário legal e fiscal, com as inúmeras alterações, é um fator a mais que influi na necessidade de evoluções constantes dos softwares.
Assim, ao implantar um ERP, a empresa tem que ter em mente que irá conviver ao longo do tempo com alterações do seu ERP, podendo ser grandes ou pequenas alterações. E deve se planejar para tal.
Mas o ponto que quero chegar é o seguinte: toda a adoção do sistema deve ser tratado dentro de uma visão mais abrangente, e que considere que o trabalho não termina com a implantação do sistema, mas continua com suas evoluções.
As fases desse ciclo são:
-Avaliação de Benefícios e de Viabilidade
-Definição das Necessidades (ou Levantamento de Requisitos)
-Processo de Aquisição (procurement) – de serviços e/ou produtos
– Implantação
– Utilização e Evolução
Nesta primeira parte, vou detalhar um pouco mais a primeira fase desse ciclo.
A primeira fase é a Avaliação de Benefícios e de Viabilidade. Nesta fase, as perguntas a serem respondidas são:
– Por quê pensamos em implantar um ERP? Que objetivos de negócio queremos viabilizar com essa empreitada? De preferência, a resposta á pergunta virá de algum item listado em um Plano Estratégico da empresa.
– Numa perspectiva de grandeza, quanto estamos dispostos a pagar pela implantação e pela operação?
– Quais ganhos (tangíveis) pretendemos obter?
– Existe um prazo crítico para implantação e início de operações?
– Quais os principais riscos que já conseguimos vislumbrar?
– Qual o custo aceitável de operação (pós-implantação) deste sistema?
As perguntas acima são apenas uma referência. Conforme a situação e a disponibilidade de informação, outros elementos devem ser levantados.
O resultado final desta fase fase (as entregas), serão:
– Uma Análise de Viabilidade (ou Business Case), mostrando as estimativas de custo, de prazo, de riscos.
– Se possível, um fluxo de caixa estimado pode ser levantado. Repare que, neste ponto, não temos muitos dados detalhados, e para se obter um estudo consistente, deve-se recorrer a diversos recursos, desde comparações com projetos similares, consultas a colegas de outras empresas, consultas a casos de implantação publicados, contatos com possíveis fornecedores.
– Dependendo do caso, pode-se fazer uma RFI (Request for Information), um recurso geralmente realizado em um processo de aquisição que visa levantar dados iniciais para o projeto.
– Essa análise não precisa ser um estudo de 500 páginas com 10 cenários de fluxo de caixa. Tem que ser aquilo que permite uma decisão por parte da empresa, se vale a pena continuar, se vale a pena comprar sistemas específicos, etc…
– Um desenho de alto nível dos processos da empresa.
– Normalmente, não se faz essa atividade num momento tão inicial de todo o ciclo de vida. A minha proposta é que, usando-se um modelo como referência (exemplo, a cadeia de macroprocessos criada por Porter), inicie-se neste ponto a criação de um desenho macro, ou até mesmo um checklist, que comece a trazer para a organização uma ideia mais formalizada dos processos da empresa.
– Neste ponto, a ideia não é detalhar esses processos, indicando para cada um, entradas e saídas, quem realiza, mas realmente um mapa inicial, abrangente. Pode até ser no formato de uma lista, de um outline, de um mapa mental.
– Classificar os processos de forma a permitir, mais adiante, uma ponderação da importância dos requisitos (lá na frente isso fará mais sentido). Uma possível classificação é:
– Processo Produtivo Essencial: diretamente relacionados ao Negócio, Diferencial. Exemplo: o processo de planejamento de projetos numa empresa de Engenharia.
– Processos de Relacionamento com os Clientes ou Comercial: aqueles ligados a vendas, relacionamento com os clientes.
– Processos de Suporte e Administrativos: são os processos gerais de suporte à organização. Dependendo da situação, processos de Procura e Compra de Material Produtivo podem ser classificados num grupo à parte.
-Processos de Controladoria ou Governança: são processos gerenciais que visam acompanhar a performance do negócio.
– Uma visão macro dos sistemas e ferramentas de TI atuais, mostrando em alto nível as “integrações” entre eles, se houver, e associando cada um aos macroprocessos.
Em próximos posts, abordarei as próximas fases do ciclo.
Quero enfatizar que, esta ideia aqui apresentada é apenas uma sugestão. Se você pesquisar encontrará ideias semelhantes ou totalmente diferentes.
Mas o ponto principal é ter em mente que o sucesso de uma implantação de um ERP começa muito antes da implantação de uma ferramenta.
Marcel,
Vejo que existe um paradigma na escolha do ERP: vamos customizar o software para fazer o que eu gosto de fazer, ou vou modificar o meu jeito de fazer para que eu possa usar o produto sem ter que modificá-lo. Geralmente opta-se pela primeira abordagem, infelizmente.
Eduardo.
Existe sim esse paradigma, na prática. O que acho que falta é uma devida atenção à certos aspectos não técnicos, como a gestão de mudanças, o gerenciamento de expectativas e da comunicação. Embora seja difícil definir uma métrica, por diversas razões, eu diria que se as customizações custam mais que 10% do valor do software, já começa a ficar complicado… A situação ideal é que se faça um mapeamento de processos que permita identificar processos que possam ser diferenciais – antes mesmo de decidir implantar o ERP inteiro, ou parte do ERP e desenvolver o resto, ou partir logo para um desenvolvimento. Este caminho, em 80% dos casos, não é mais a melhor relação custo-benefício, pois já existe muita coisa no mercado que atende os processos “commodities”.